Ano de 2067.
Tenho 78 anos e meu nome é Hugo. Acabo de comemorar meu aniversário e sinto orgulho em dizer que sou a pessoa mais velha de minha família. Tarefa árdua, mas que consegui cumprir. É claro que não me resta muito tempo.
A água fez acontecer guerras e destruiu toda a minha família. Parte dela foi morta em um assalto por água. Outra parte abandonou a miséria do Brasil para viver num lugar menos disputado pelo mundo. Sim, o brasileiro enfrentou conflitos inimagináveis em função da demanda de água que possuía.
Tenho dois filhos. Um deles chora agora. Sede. Corta-me o coração não poder fazer nada. O governo nos cobra taxas imensas pelo uso de água. Não tenho dinheiro e trabalhar por recursos hídricos (sim, hoje as pessoas são assalariadas por água) é algo impossível para mim. Estou desnutrido e sem forças. Cedo o pouco que tenho para minha filha mais nova, Ana.
Esta sempre me pergunta como eram os velhos tempos. E sempre me olha com certa desconfiança quando falo das grandes florestas e lagos que já vi.
- Pai, eu não consigo entender o porquê ninguém fez nada, mesmo sabendo de tudo o que aconteceria.
Vergonha. Minha filha de trinta e sete anos parece ter sessenta agora. Os rostos de hoje não são mais como os de antigamente. Ressecados pelos raios ultravioletas, as faces das mulheres já não resguardam tanta beleza.
Chagas pelo corpo são tão comuns como eram as tatuagens na minha época de adolescência. Corpos são desfalecidos. Banho de chuva? Não, obrigado! Não se brinca com ácido.
Não tenho mais vontade de viver e choro de desespero algumas noites por não saber o futuro das pessoas que passaram por minha vida. O que ocorreu com meus amigos de faculdade? E as pessoas com quem trabalhei? Como os poucos familiares que me restaram estariam lidando com a escassez da água no exterior?
Saudades do tempo em que todos eram felizes.
[desabafo fictício de um ser humano no ano de 2067]
sexta-feira, 30 de março de 2007
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